segunda-feira, 17 de agosto de 2009

As origens do Fado.


As Origens do FADO
como Expressão Musical

Se já leram mais de 60 livros sobre este delicado assunto, de certeza que têm a noção de que vou falar de um assunto polémico. Se são estudiosos da matéria, nalguns pontos de certeza que estaremos em discórdia. Mas quando se investiga um determinado assunto criamos dentro de nós um conceito sobre a matéria estudada. Não sou detentor da verdade pura, mas sou contra as burrices de ideologias não fundamentadas.
Falar de FADO é ler e reler as diversas opiniões, mastigá-las bem, dar sete voltas à língua... botar faladura e seja o que Deus quiser. Qualquer que tenha sido a origem do FADO a opinião de Alberto Pimentel, para mim, é a mais credível. No seu livro "Triste Canção do Sul" ele é bem claro nas suas investigações. Luís de Camões, na sua epopeia "Os Lusíadas" utiliza 18 vezes a palavra fado. É precisamente aqui que o leitor menos atento começa por ter conceitos errados sobre a origem do FADO.
A palavra fado é uma coisa e FADO, como expressão musical, é outra. A comprovar esta afirmação está o estudo feito, por Alberto Pimentel, da literatura portuguesa do século XVI, XVII e século XVIII. Tinop não partilha da mesma opinião. Vislumbra no FADO uma origem marítima. É pouco provável. Sendo Portugal um país com tão grande extensão marítima, O FADO teria aparecido em diversos pontos de Portugal, levado por marinheiros e constaria dos arquivos e diários de bordo, por exemplo na Ponta de Sagres, onde existiu a Escola Náutica. Outra opinião não fundamentada é a visualização de semelhanças entre o FADO e o Lundum, dança de umbigada africana. Se assim o fosse, mais uma vez ele teria sido levado para outros pontos e não teria ficado circunscrito à zona de Lisboa.
Estabelecer uma ligação directa do FADO com a nostalgia das Mornas, com o Tango argentino, com as Festas de S. João de Braga ou com a solidão de um marinheiro no alto mar, implicaria que o mesmo tivesse aparecido no pulsar de outros povos de culturas bem diferenciadas da portuguesa. Que os portugueses de agora possam saborear o FADO em diversos pontos do nosso território, não faz do FADO a canção nacional.
Cada província portuguesa tem maneiras de estar de cantar e de sentir bem distintas. Retomando as ideias de Alberto Pimentel, primeiro nasceu o homem e depois a expressão musical. Isto é, primeiro nasceu o fadista e depois o FADO. Mas o primeiro fadista não cantava. A ele eram encomendados, por ser destro no manejo da navalha, o fado de muita gente. Esta personagem aparece com toda a lógica com a instabilidade do país, aquando da fuga da família real para o Brasil. Napoleão Bonaparte decreta o Bloqueio Continental e Portugal vê-se evadido e saqueado pelas tropas Napoleónicas. As ruas mal iluminadas e as casas, de gente endinheirada, abandonadas aguçam o apetite à mão do alheio. Um país saqueado tem fome, e casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão. As vinganças e os ajustes de contas fazem aparecer no nosso país esta personagem de melenas compridas que encobriam a sua face, o juiz de todas as discórdias.
O fadista era temido por tudo e por todos, gabando-se, nas tascas mal iluminadas, dos seus feitos heróicos. É bem provável que nas sua visitas a casas de pessoas endinheiradas, que acompanharam a fuga da família real para o Brasil, ele tenha descoberto a Guitarra Portuguesa e na sua companhia comece por cantar as suas proezas.
A Guitarra Portuguesa que encontra os seus primeiros adeptos no Porto tem a sua origem próxima num instrumento inglês chamado Cistre (não confundir com Sistro, forquilha de madeira com soalhas de metal - da família dos Chincalhos), que entra pela Barra do Douro onde atracavam os barcos que faziam as trocas comerciais com os ingleses.
O Mestre de Capela do Porto António da Silva Leite, devido ao entusiasmo crescente por este instrumento, nacionaliza-o e escreve um estudo para Guitarra, dedicado a Dona Antónia Magdalena e coloca-o à venda 1200 réis, no dia 15 de Março de 1796. As músicas propostas por este estudioso são Minuetes, Marchas, Alegros e Contradanças.
Neste estudo de Guitarra não consta qualquer referência a nenhuma expressão musical que tenha a ver com FADO. Se o mesmo já existisse, também ele deveria ter sido contemplado por este professor de música. Só a partir desta data, a palavra Guitarra passa a pertencer ao vocabulário português.
De salientar a importância de um outro Método datado de 1789, escrito por Paixão Ribeiro para Viola de Arame de 12 cordas e 5 ordens com o título "A Nobre Arte da Viola". A Guitarra de Silva Leite só tinha 10 cordas, as 4 primeiras ordens duplas e as restantes singelas (utilizava a afinação natural - do agudo para o grave Sol, Mi, Dó, Sol, Mi, Dó) pela análise destes documentos podemos afirmar que a Guitarra nasceu sem conhecer o fado.
Parabéns ao nosso amigo e "colega do ramo", José Lúcio, como muito bem diz o nosso companheiro Sebastião Pinto Varela, pelo excelente trabalho apresentado.

A chamada guitarra portuguesa.

Apresentamos nesta página um excelente trabalho de investigação, do estudioso musicólogo José Lúcio, que merece toda a nossa admiração porque sustenta uma tese histórica e científica.
A GUITARRA E O FADO

A palavra GUITARRA, não identifica nenhum instrumento em especial, excepto se a localizar temporalmente e geograficamente. Cada país tem a sua guitarra. Se for a Espanha comprar uma " guitarra ", o empregado traz-lhe uma viola. Já agora, quando é que será, que a rapaziada passa a chamar às "guitarras eléctricas de violas eléctricas, às guitarra de Folk violas de Folk e os cursos de guitarra clássica, passam a ter o nome correcto de viola dedilhada.
Mas, como terá aparecido no vocabulário musical a palavra GUITARRA e especificamente em Portugal.
A palavra GUITARRA, sem especificar a que tipo de guitarra no referimos, tem a sua origem etimológica na língua Grega, "Kythara", que os latinos transformam em "Cithara".
Dentro da mitologia existem, várias lendas sobres a origem desta palavra:
A palavra GUITARRA, proveio de " CYTHERON " , nome de uma montanha habitada por musas.
Do antigo nome " CYTHARA ", nome de ilha grega - CERIGO , paraíso da poesia e do amor, onde existe um templo dedicado a Vénus.
Atribui-se a invenção de um cordofone, um mouro/espanhol, que viveu na idade média de nome AL-GUITAR.
Pela análise e leitura comparada, de vários documentos que abordam este assunto, é tido como certo a existência de dois tipos de guitarras, na Península Ibérica, na Idade Média: a Guitarra Mourisca e a Guitarra Latina. A primeira de forma ovalada, a segunda com enfraque, isto é, em feitio de oito.
Se puder e tiver paciência para isso, consulte o livro de Juan Bermudo, "Declaracion de Instrumentos Musicales" publicado em 1555, que se encontra na Biblioteca Nacional de Paris (está escrito em Espanhol do séc. XVI e existe uma edição fac-similada na Biblioteca Nacional de Lisboa).
Ainda hoje, muitas são as pessoas que confundem viola com guitarra. A confusão, está na pouca identidade da cultura musical Portuguesa. Muitos são os professores que dão "as aulas de guitarra clássica" quando o instrumento que ensinam, se chama de viola ou violão, em Português.
Para os mais cépticos, consultar o dicionário de música, de Thomaz Borba.
Musicólogos atentos estudaram, a terminologia utilizada pelos escritores Portugueses, chegando a conclusão, que se a palavra VIOLA já era utilizada no século XV e, a palavra GUITARRA só é utilizada no século XVIII. Tem a sua lógica, porque é nesse século que a Guitarra Portuguesa, corta o seu cordão umbilical. Não como os mais saudosistas pretendem, ter estado presente em Alcácer-Quibir, batalha no norte de África onde D. Sebastião perdeu a vida, ou talvez não, em 5 de Agosto de 1578. Segundo as crónicas do frade francês Caveral, os portugueses teriam deixado ficar no campo de batalha, 10.000 guitarras. Quem analisou este documento e o traduziu para português, não teve o cuidado de traduzir a palavra "guiterne" para Viola. Assim, tendo em conta a veracidade dos documentos analisados, poderei afirmar que primeiro apareceu a Guitarra Portuguesa (final do século XVIII), só depois aparece o FADO (como expressão musical).
Portugal é um País muito rico, nos diversos Cordofones que apresenta. Assim, além do Violão tradicional de 6 cordas, companheiro das Fadistices da Guitarra Portuguesa, existem várias violas de arame, com características bem definidas:
A Viola Amarantina (Amarante), Viola Braguesa (Braga), Viola Beiroa (Castelo Branco), Viola Toeira (Coimbra), Viola Campaniça (Alentejo), Viola de Arame (Madeira ), Viola da Terra (S. Miguel, Açores) e Violas de 15 e 18 ordens da Terceira (Açores).
Cada um destes instrumentos, tem uma afinação própria, um determinado número de cordas, enfim uma personalidade enraizada, por mãos calejadas, que os tocam com a sabedoria adquirida ao longo de gerações. Só porque são do povo e não do ambiente clássico, ninguém tem o direito de os destruir.
Gosta que lhe troquem o nome, ou o façam passar por outra pessoa?
Apesar da Guitarra Portuguesa ser um bocadinho mais velha que o FADO, não me diga que estes assuntos não são cativantes.

Recomendo-lhe o livro de Armando Simões, A GUITARRA bosquejo histórico (1974).


http://http://www.jose-lucio.com/Pagina2Fado/Guitarra%20e%20Fado.htm